sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Estava quase me suicidando e teria me matado, só que meu psicanalista era um freudiana estrito, e se a gente se mata eles nos fazem pagar as sessões que faltamos. - ( Annie Hall, 1977, Woody Allen).

Agradeça a vida ao seu psicanalista, então. :-)
Boa piada hiperbólica, mas nas primeiras sessões, não cobradas, é estabelecido um contrato psicanalítico, geralmente informal. Este contrato PRECISA ser cumprido para efeitos de encerramento de tratamento, não por interesse financeiro (bons analistas tem a agenda lotada e nem precisam nem se interessam em manter "dependências", ao contrário), mas porque o ato de começar ou encerrar trabalhos analíticos SÃO movimentos do inconsciente e não do consciente; e, portanto, analisáveis.

Interrupções não programadas e não discutidas em sessão, como a que a piada exagera com a imagem de um suicídio (observe que não é uma morte acidental, mas uma causada por neurose, por sofrimentos psíquicos da pessoa), são portanto SEMPRE movimentos de resistência ou transferência de algum modo. Claro que ambos podem encerrar o tratamento, conforme combinado na sessão inicial. Mas isso é um movimento transferencial, e precisa ser analisado. No meu caso, eu peço pelo menos uma sessão de aviso prévio, para que voltemos nas fichas e avaliemos DE FATO o trabalho realizado, além de compreendermos os motivos para o fim do que não é apenas um trabalho, mas um profundo relacionamento de longo prazo, com todas as suas forças psíquicas envolvidas - não raro um dos mais profundos, sinceros e transparentes que o paciente experimentou na vida.

Em psicanálise, a transferência e contra-transferência são não só fatos, como um dos temas centrais de nossa análise. E nada mais transferencial do que um encerramento abrupto das sessões por desejo agressivo, descontinuador e impulsivo (o simbolismo do suicídio) do paciente, concorda? Supondo que a pessoa que escreveu - e transcreveu - isso estivesse viva, não sendo psicografia devo deduzir que o pacliente (sic) tem o desejo violento de impedir a possibilidade de análise, e fantasia isso a partir da redução da relação clínica ao monetário, o que lhe permitiria moralmente "matar o analista" e encerrar violentamente o processo, ainda que aqui deslocado para um matar-a-si-mesmo. E se matar-o-analista é um matar-a-si-mesmo, parece que temos bastante assunto para a próxima sessão, seja ela de encerramento ou não. ;-)

Fala que eu te escuto... Pergunte-me qualquer coisa:

Um pouco de loucura é necessário para viver ?

Loucura, não. Mas uma pequena pitada de fantasia é indispensável para se viver bem. A religião, por exemplo, ocupa o lugar dos contos de fadas das crianças. A sexualidade também está repleta de projeções. E nossas crenças, científicas ou espirituais, estão sempre mudando, mas ainda assim fantasiamos que nosso paradigma atual seja o definitivo. Há um infinito antes de nós, e outro infinito mais adiante, e sequer sabemos se e como participaremos dele - mas ainda assim vivemos a ilusão que o breve tempo que passamos por aqui é toda uma vida, para podermos vivê-la com um pouco de pé no chão.

É muito difícil observar a vida como de fato ela é, temos todo um hemisfério cerebral direito para processar o não-racional (deve ter sua causa), e não há nada de errado em colorir um pouco as coisas, ou cozinhar com uma (leve) pitada de tempero e sal. Já a loucura e delírios, patológicos, vem de uma negação da realidade, em que regredimos a um estado infantil de modo a que possamos continuar vivendo apenas de fantasias como se fossem reais, o que não é normal ou saudável a partir da adolescência, embora muitos "religiosos" insistam na prática infantil, como ensina Freud em sua obra "O Futuro de uma Ilusão".

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terça-feira, 19 de outubro de 2010

Lázaro, fui ver Tropa de Elite 2 no final de semana , e na famosa cena de "tortura no saco plástico" a sala do cinema foi ao delírio, Por que as pessoas gostam tanto de ver uma cena de tortura + abuso de autoridade onde a prox. vitima pode ser ela mesma?

Não vi o filme, mas a psicologia de massas tem dinâmicas próprias, como se fossem um grande ser feito pelo coletivo, e que frequentemente refletem valores que seriam assumidos por cada um individualmente. O grande Leviatã coletivo que surge permite espelhar no visível certos mecanismos que, em cada um de seus indivíduos, só seria perceptível no INCONSCIENTE. Daí essa catarse coletiva, também presente em linchamentos. Pelo que você descreve, parece haver algo de sadomasoquismo, ou talvez projeção esquizoparanóide - quando criamos um Judas ou Bode para expiar males que, se atribuídos ao externo que será eliminado, temos a sensação (falsa) de não se tratar de algo que temos também em nós.

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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Estamos caminhando para a falta de amor? já vi sociólogos falando de ''familia unipessoal'' a solidão está cada vez mais presente. Muito egoísmo, que mundo é esse? me sinto cada dia mais perdido, tenho 20a e da vontade de desistir.É assim mesmo?

Não, não creio que "seja assim mesmo", nem que devamos desistir e nos desiludir. O que está claramente errado pede vozes que apontem onde e porquê.

E embora vivamos tempos de fato complicados na reelaboração do papel da família, do afeto e da espiritualidade, em que demandamos novas formas de lidar com a essência desejada do que estava presente em instituições e dogmas indesejados, tendo a ser um otimista e romântico. Não acredito que vivamos sem valores, e mesmo se isso ocorresse, não seria por muito tempo. Inúmeros fundamentos que parecisam supremos e eternos já cairam, e a humanidade ainda assim sobreviveu, cada vez melhor. A história e a filosofia demonstram que toda vez que uma sociedade parece perder seus valores, acaba importando uma versão repaginada de valores de outros tempos.

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Nessa epoca de eleição tenho visto ser levatada a questão das religiões por parte dos candidatos, não lhe parece de certa forma "medieval" ter que falar em Deus para fins politicos? Ainda há pessoas que se decidem seus votos por este assunto?

Acho bastante medieval, no pior dos sentidos de medieval. Mas na minha observação, infelizmente a baixaria, bullyng e apelação tem vindo de um lado só. E pior ainda, parece que tem dado resultados. Temo uma eleição que seja decidida pelo melhor uso da FALTA de ética.

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