quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O que você diria a quem afirma que a evolução das neurociências tende a sepultar a psicanálise, já que ninguém provou a existência do complexo de édipo ou do id ou superego?

Sugeriria que esta pessoa se informasse mais, em especial em relação à Neuropsicanálise e Mark Solms. E faltaria a ela também um pouco de visão de teoria do conhecimento, uma vez que confunde a psicanálise (que é da área das ciências humanas, e próxima da filosofia e sociologia, ainda que clínica) com seus elementos biomédicos ou cognitivo-comportamentais. Seria o mesmo que querer compreender o amor do poeta a partir da simples análise dos átomos de carbono da tinta deixada no papel. Eu lhe mostro uma figura de linguagem, uma metáfora, uma estrutura literária, e o "cientista" me diz que isso não pode existir, uma vez que são apenas pixels de tinta reproduzidos por uma impressora. Seria um papo de maluco, não é? Infelizmente, algumas pessoas - por ignorância mesmo - pagam esse mico. Os verdadeiros neurocientistas e psicanalistas não pagam, e muitos deles até trabalham em conjunto. Vejo sempre neurocientistas no sindicato de psicanálise de São Paulo, e nós mesmos estamos sempre nas formações complementares do Instituto de Psiquiatria da USP. Quem vê essa divisão, ás vezes, é leigo que adotou um lado para torcer. Ou, é claro, autores sensacionalistas tentando lutar com uma suposta divisão.

Psicanálise e Neurociências não são religiões para se torcer por. Ambas evoluem, precisam sempre se atualizar, e todo o conhecimento humano se complementa em teses, antíteses e SÍNTESES. O próprio termo "sepultar" e "provar" já são tendenciosos na colocação. Psicanálise fala de psicoDINÂMICA, e não de neurotransmissores. Provar a existência do átomo cerebral não invalida a existência da vida e pensamento imaterial. São visões diferentes e complementares.

Falar em "provar" implicaria discutir o que é "método científico" e epistemologia. Essas instâncias citadas existem, na função psicodinâmica delas. Mas são estruturas de uma visão filosófica e tópica do FUNCIONAMENTO da mente (software) humana inserida em um contexto social que a molda em torno de desejos e repressões. Isso não é assunto apenas de neurotransmissores, mas também de antropologia, sociologia e filosofia - disciplinas que também "existem", embora não sejam de comprovação "epistemológica".

Ou seja, há conhecimento fora da epistemologia científica, que é apenas UMA DAS formas de adquirirmos informação. Psicanálise é multidisciplinar por definição, e não tem nem quer ser reduzida a neurotransmissores - embora BONS psicanalistas se atualizem constantemente em relação a psicopatologias e neurociências.

Como costumo dizer aos pacientes, psicanálise não é "terapia", "curandeirismo" ou "ato médico". Ela está mais para uma filosofia clínica, com profundas possibilidades de mudança na ESTRUTURA do indivíduo. Jung costumava dizer que se compreendermos realmente o que fazemos na clínica junto à existência do sujeito, chamá-lo de "paciente" é praticamente uma ofensa. A psique não é uma doença, psicanálise trabalha com o software e não somente com o hardware. e não dá para compreender o amor do poeta a partir

Fala que eu te escuto... Pergunte-me qualquer coisa:

Nenhum comentário:

Postar um comentário